terça-feira, 5 de julho de 2011

Ao mestre Nunes, com carinho e admiração

Enio Lins – publicado em seu blog na Gazetaweb

Nunes Lima se foi. Ficará eternamente entre nós com sua obra, imorredoura, de meio século em desenhos e crônicas publicadas quase que diariamente.

Meus primeiros desenhos, no começo da década de 60, anos a fio, foram cópias das charges publicadas por Nunes na Gazeta de Alagoas. Além dos exemplares circulantes, creio que a partir dos seis anos, uma tia materna, Eunete (Tia Neta) me presenteou com uma coleção de desenhos dele. As charges eram meticulosamente recortadas Gazeta e coladas com goma arábica numa revista da AABB. Depois o mesmo trabalho continuou a ser feito por minha mãe (Eunizze). De forma que sempre tive a disposição uma considerável coleção dos trabalhos do mestre.

No começo da carreira, nos anos 80, “tirava” as férias do Nunes na Gazeta de Alagoas. Pós-aposentadoria dele fiquei fazendo as charges, nem sempre todo dia. Mas sempre acalentava a ideia de repescá-lo da posição de aposentado, projeto enormemente reforçado depois de um comentário do Plínio Lins onde ele me trouxe a opinião do jornalista Jurandir Queiroz de que o Nunes jamais deveria ter o direito de se aposentar. Em 2005, finalmente, graças a uma decisão do sócio-proprietário da OAM, Fernando Collor de Mello, que reassumia naquele momento o comando das Gazetas, a operação resgate foi executada. E o Nunes regressou, aceitando fazer uma charge por semana, pois argumentava que a saúde não lhe permitia os traços cotidianos de outrora.

Há cerca de dois anos, a saúde dele se deteriorou e seu desenho não pode mais ser feito, efetivamente, como antes. De comum acordo, decidiu-se republicar charges, com ele mesmo contribuindo na prospecção do passado. E assim fomos remando, até domingo.

Nunes Lima é um dos chargistas mais importantes do Brasil. Em todo País ele foi um dos raros profissionais cujos trabalhos foram, ao longo de muitos anos, espontaneamente colados em balcões de bares e restaurantes, paredes e portas de borracharias e oficinas, em espelhos de barbearias. Poucos foram tão populares quanto ele.

Nunes seguia uma escola quase extinta. Talvez ele tenha sido o derradeiro seguidor do grande mestre Carlos Estêvão, mineiro imortalizado pela segunda fase do Amigo da Onça. Esta lista também contempla o criador e desenhista da primeira fase do Amigo da Onça, o pernambucano Péricles. Ambos ambientados no Rio de Janeiro, o mineiro foi além do personagem amoral de bigodinho e gravata borboleta e suas charges sobre o cotidiano das classes médias menos favorecidas (problemas com ônibus, mercado, emprego…) são um testemunho do estilo de vida de amplas camadas de sofredores sociais. Nunes seguiu esse caminho, contraditando a tendência majoritária do foco político.

Nunes, como Carlos Estêvão era, em primeiro lugar, a crítica social, de costumes. Também batia na política, mas essa não era o alvo principal.
Nos trabalhos de Nunes, publicados durante 52 anos na Gazeta de Alagoas está um depoimento forte, profundo, denso da vida do povão. Como ele bem definiu no título de sua coluna de crônicas, ele retratava a vida sem retoques.

A vida sem retoque, seja no traço, seja no texto. Nua e crua, expondo não as dificuldades e os méritos dos menos favorecidos, mas também seus preconceitos, suas cismas, suas falhas.

O mestre se foi. Mas nos lega uma obra memorável, indelével.

Mestre Nunes: Parabéns por tudo que você fez; obrigado por tudo que nos ensinou.

Um comentário:

Luiz Pompe disse...

Excelente texto em homenagem ao querido ex-colega de redação e de sindicato Nunes Lima. Suas charges são motivo de orgulho para os alagoanos, que agora adicionam esse talentoso conterrâneo no painel de tantos outros inesquecíveis talentos que já nos deixaram.
A você,Ênio, que é também motivo de orgulho para seus conterrâneos, parabéns pela merecida homenagem a Nunes Lima!