sexta-feira, 18 de abril de 2008

Deputado Paulão reafirma sua inocência e diz que renuncia se for comprovado que pagou empréstimo com a GAP

O deputado Paulão concedeu entrevista na manhã desta quarta-feira, 16, ao radialista França Moura, da Rádio Jornal, para falar a respeito das denúncias que vêm sendo veiculadas contra ele na imprensa e o depoimento que prestará no próximo dia 22, na sede da Polícia Federal, às 15 horas, quando apresentará sua defesa baseada em documentos. O deputado diz que é inocente e que se defenderá das acusações.

“Eu faço um desafio: se o inquérito comprovar que eu paguei o empréstimo com a GAP (Gratificação de Assessoria Parlamentar), eu renuncio ao meu mandato, tenho informações de que vários deputados têm uma maneira de burlar o Imposto de Renda usando essa gratificação e quero dizer que nunca usei essa GAP. Que os deputados que fizeram uso dela respondam” disse ele.

Paulão disse que as denúncias contra ele ferem e arranham o seu projeto parlamentar, argumentou que tem origem popular. “Fui office-boy, trabalhei em farmácia, com refrigeração e tenho 32 anos como funcionário da Ceal, com muito orgulho. Estou no meu terceiro mandato como deputado estadual sem comprar voto”, disse ele.

“Se eu soubesse que tinha alguma ilicitude no empréstimo eu não faria a operação”, disse Paulão fazendo um histórico da sua vida sindical e parlamentar dizendo que desde 1999 tem uma luta contra ele na Assembléia, mas que vai continuar fiscalizando que é uma das prerrogativas do parlamento. “Por dizer a verdade eu pago um preço alto. Estou tendo fé, juntando documentos e tenho a convicção de que sou inocente e se eu não for inocentado vai ser uma surpresa ruim para mim”.

O petista explicou que tudo começou quando concedeu uma entrevista à TV Gazeta e cobrou transparência do dinheiro público. Ele avalia que desagradou a algumas pessoas e foi criticado em uma rádio pelo deputado Cícero Amélio e disse que rebateu no mesmo veículo. Em seguida, Paulão disse que o deputado João Beltrão usou a tribuna da casa e falou que se fosse indiciado ele também iria.

“O processo foi montado, toda a imprensa recebeu a carta anônima e só uma rádio divulgou”, disse Paulão, acrescentando que na sexta-feira passada saiu notícia nos jornais e nos informativos eletrônicos (sites) dizendo que ele seria indiciado por conta das denúncias feitas na carta anônima e das cópias dos nove cheques. O deputado do PT disse que o que foi divulgado como sendo cópias de extratos bancários “são na verdade uma programação bancária e é diferente de um extrato”.

“Tenho 32 anos de Ceal; o patrimônio que eu tenho é quase o mesmo que eu tinha antes da minha atividade parlamentar. Quando eu fui ao banco eu fui de boa fé e entendo que a responsabilidade é do banco e da Assembléia”, argumentou. Paulão observou que o delegado é o dono do inquérito e que vai responder às perguntas que forem feitas.

O parlamentar disse que solicitou cópia do extrato ao Banco Rural e que pediu explicação, por meio de documento sobre a violação da sua conta particular. “Se eu tivesse dinheiro sobrando eu não pediria empréstimo”, disse, acrescentando que o banco e a Assembléia tinham um contrato e que a prerrogativa para o empréstimo era o aval da Assembléia.

Paulão também questionou se os deputados envolvidos na Operação Taturana teriam coragem de fazer um comparativo e colocar o patrimônio que tinha antes da atividade parlamentar e o de agora. “A carta anônima é um instrumento de covardes e apresentei uma moção de solidariedade ao dr.Coaracy (procurador-geral de Justiça) e ao desembargador Antônio Sapucaia”, explicou, argumentando que a decisão do desembargador não coloca clima par que os deputados indiciados voltem e por isso eles estão se sentindo acuados.

“Eu não tenho medo, não vou calar e vou até o fim”, disse Paulão ao radialista França Moura. O petista argumentou que numa reunião ocorrida entre alguns dos deputados da Taturana ele foi citado por porte de arma e certidões da Justiça constavam que havia um homônimo seu que estava com problemas a esse respeito. “Se eu fosse indiciado por crime não poderia ser candidato a deputado”, observou. (Blog do deputado Paulão).


Fonte: Blog da Olívia de Cássia


quinta-feira, 17 de abril de 2008

Crise na Assembléia e Mobilização Popular

Artigo de Golbery Lessa (Cientista social, Doutor/Unicamp)

As firmes ações da Polícia Federal, do Ministério Público, da Imprensa e da sociedade civil organizada têm sido fundamentais para o início do processo de renovação radical que a Casa de Tavares Bastos precisa passar para honrar a memória de seu ilustre patrono e a fibra do povo que a instituiu e financia. Entretanto a sociedade civil organizada, o elemento mais importante em qualquer processo de renovação das práticas e da cultura políticas, tem cometido grandes erros (por ações e omissões) nos seus processos de organização e mobilização e nas análises que tem feito dos acontecimentos. Mesmo sem tirar o mérito de tudo que já foi feito pelo MSCC (Movimento Social contra a Corrupção e o Crime) e pelas entidades ligadas a alguns setores empresariais empenhados na causa, é necessário discutirmos abertamente esses erros para que não se perca a grande oportunidade que a história está oferecendo aos alagoanos por falta de coragem intelectual e política.
O Legislativo é o principal foco da atividade política numa formação social por que tende a expressar de maneira mais completa a diversidade da sociedade civil. O Executivo e o Judiciário são mais sintéticos, representam, respectivamente, a vontade da maioria no que se refere à execução das leis e à sua interpretação. A atual crise de confiança vivida pela Assembléia Legislativa Alagoana tem, portanto, uma importância decisiva para o futuro da prática e das idéias políticas em Alagoas, com reflexo direto nas possibilidades de desenvolvimento sócio-econômico do Estado. A crise é, portanto, essencialmente política, ou seja, referente àquela esfera da prática social na qual a sociedade debate e resolve seus problemas imediatos universais.
O principal erro do MSCC está expresso no seu próprio nome. A entidade formou-se e designa-se como “movimento social”, ou seja, uma organização não diretamente política, um órgão disposto a agregar um conjunto de indivíduos com determinada reivindicação setorial. Trata-se de um movimento focado apenas na luta contra o crime e a corrupção, que são somente dois dos múltiplos elementos envolvidos na crise atual. O crime e a corrupção só podem ganhar importância na luta e na manutenção do poder quando o sistema democrático é negado na sua essência, o que é determinado por particulares características econômicas e culturais que uma formação social pode desenvolver. É uma determinada configuração perversa do sistema sócio-econômico e da cultura política (grande concentração da renda, atraso radical da industrialização, baixo grau de urbanização e alta concentração fundiária e outros elementos com efeitos análogos) que fragilizam o Estado de Direito e tornam possível a emergência do crime e da corrupção no espaço político. Ou seja, o crime e a corrupção são efeito e não causa da fragilização do espaço democrático e, portanto, a mobilização da sociedade civil organizada precisa ser pela mudança radical das práticas políticas arcaicas (mandonismo, clientelismo, patrimonialismo, nepotismo e a compra do voto) e das idéias que as fundamentam; o combate ao crime e à corrupção deve ser uma das ações nesse universo, não a única ou a principal. É preciso, por exemplo, lutar para mudar as formas de fazer campanhas eleitorais, de elaborar programas políticos e de exercer mandatos eletivos. A tarefa essencial é mudar toda a cultura e as práticas políticas.
É política a essência das tarefas da sociedade civil alagoana diante da crise do Legislativo e das tradicionais práticas ilegítimas e ilegais de disputa pelo poder. A atitude do MCSS constituiu uma situação bastante esdrúxula: no momento em que o núcleo das velhas práticas mandonistas é gravemente fragilizado no interior da Assembléia, na conjuntura em que essa fragilidade abre um espaço enorme para novas lideranças e para o avanço das forças populares e das práticas democráticas, no instante em que o vazio de poder aberto pela crise abre as mais positivas possibilidades e os mais graves perigos de retrocesso, as principais entidades da sociedade civil decidem não fazer política, escolhem regredir para uma atitude de reivindicar mudanças setoriais. Os grandes adversários do progresso de Alagoas caem pelas tabelas e, em resposta, a sociedade civil não tem demonstrado lucidez nem capacidade de propor um novo projeto que promova novas práticas e novos valores políticos para o Estado.
A falta de adesão massiva da população alagoana aos atos públicos propostos pelo MSCC já deveria ter feito as principais lideranças repensarem o perfil e os rumos da entidade. Nas manifestações promovidas pela entidade têm estado presentes principalmente os movimentos agrários, o movimento indígena, algumas lideranças estudantis, figuras representativas do movimento de mulheres e representantes dos sindicatos urbanos (apenas as lideranças desses sindicatos). A classe trabalhadora urbana (enquanto massa) e a classe média, dois pólos fundamentais de qualquer mobilização, estão ausentes. Isso ocorre porque o fala, a prática e as formas de mobilização propostos pelo MSCC não estão adequadas à expectativa da maioria da população, que deseja um verdadeiro programa político, com começo, meio e fim. Ninguém sairá as ruas para constituir novas lideranças se não tiver garantias que não estará contribuindo para instituir novos déspotas; o cidadão consciente não irá até a porta da Assembléia sem que antes perceba a emersão de lideranças capazes de demonstrar, por meio de suas idéias e propostas de controle social sobre sua própria atuação, que merecem respeito e confiança.
As entidades empresariais mobilizadas pela modernização das práticas e dos valores políticos têm cometido os mesmos erros do MSCC, com algumas singularidades (os usineiros ainda não se manifestaram publicamente sobre o assunto, o que parece demonstrar que não estão muito dispostos a mobilizarem-se pela modernização política do Estado). Assim como o MSCC, essas entidades não apresentam um programa concreto e positivo, além disso sequer ensaiam um chamamento à participação massiva de seus associados nos atos públicos, uma das principais formas de fazer política na sociedade contemporânea. Seguem fazendo política de cúpula e de notas à imprensa, como se tivessem receio de uma aliança com os trabalhadores e com a massa da classe média. Essas entidades ainda precisam provar para o resto da população que os setores empresariais que representam estão verdadeiramente dispostos a dar sua cota de sacrifício pelo bem comum.
Em qualquer esquina ou no interior das residências é fácil aquilatar o alto grau de revolta e de potencial de mobilização em torno da crise da Assembléia Legislativa. Há um sentimento generalizado de repulsa ao status quo e expectativa sobre os novos rumos que pode tomar o universo político; as pessoas querem novas práticas, novos valores, novas lideranças, nova forma de fazer campanha eleitoral e de cumprir os mandatos. Mas esse sentimento generalizado não está sendo convenientemente organizado num grande caudal de renovação e civismo; falta uma entidade coletiva diretamente política, falta um fórum pela renovação das práticas e dos valores políticos em Alagoas, um órgão capaz de congregar todos os indivíduos dispostos a realizar a modernização completa do universo político estadual. Um fórum com reuniões amplas e regulares, nas quais qualquer habitante do Estado pudesse dar seu depoimento, fazer seu desabafo sobre as mazelas da sociedade alagoana, conversar com especialistas em cada tema e fazer suas propostas de mudança; um órgão capaz de realizar na sua prática os valores republicanos; uma entidade capaz de formular, junto com todo o povo, novos projetos e de ser uma referência de discussão legislativa enquanto perdurar o vazio de poder legítimo no Legislativo alagoano.

sexta-feira, 11 de abril de 2008

Comando de Caça aos Compradores de Votos

Não faz muito tempo, em eleições anteriores ao advento da urna eletrônica, o político corrupto e corruptor da vontade popular dispunha de vários recursos para fraudar o processo eleitoral. Como participei de coordenações de várias campanhas, recordo-me dos treinamentos que fazíamos com os fiscais para tentar impedir essas fraudes. Em resumo a ação dele era assim:

1 – Abordava o eleitor e prometia-lhe emprego público (não havia concursos), uma casa da Cohab e uma “feirinha” para ir comendo enquanto esperava;
2 – No dia da eleição, mandava buscar o eleitor em casa e o levava até o local de votação, garantindo-lhe a alimentação e o retorno até a sua residência;
3 – Quando não corrompia os participantes da mesa receptora de votos, ele mesmo montava as suas próprias mesas para:
a – levar a urna já “prenha”, “engravidada” na noite anterior;
b – facilitar a vida dos “cabos eleitorais” que votavam pelos mortos ou usando falsamente os títulos de eleitores em quem ele não confiava;
c – empurrar "goela abaixo" da urna um monte de votos irregulares para anular todos os votos daquela secção eleitoral (quando isso interessava) e,
d – trocar a urna durante o deslocamento até o local de apuração.
4 – Indicava mesários das mesas apuradoras de votos, ou corrompia alguns dos já cadastrados. Durante a contagem era ladrão roubando ladrão:
a – o mesário corrupto contava a mais para o seu candidato e a menos para os adversários;
b – o secretário da mesa apuradora, quando participante do esquema de fraude, ouvia um número e anotava outro do seu interesse e,
c – o “mapista” da justiça eleitoral, ainda no local da apuração, recebia um mapa da urna e datilografava outro.
5 – já no TRE e antes da montagem do mapa final, travavasse uma verdadeira batalha campal para se descobrir que resultados iam chegar por lá e se a discrepância seria muito grande em relação à verdadeira vontade do eleitor. Nesse momento ainda haveria a chance de reclamar e tentar reverter algum prejuízo com recontagens ou verificação de mapas.

Como se vê as opções de fraude eram diversas. Com a utilização de urnas eletrônicas e a crescente perda de mandato por crimes eleitorais, praticamente sobreviveu a “infiltração” de mesários e o agrado ao eleitor. Significa dizer que todos os recursos, antes espalhados durante o processo de transporte – votação - apuração, agora se concentram na compra do voto, a última grande trincheira da corrupção eleitoral. Métodos requintados foram elaborados para essa prática deletéria. “Cadastros” são montados sob a supervisão de um coordenador que recebe os recursos, retira a sua “participação nos lucros” e repassa o restante para os eleitores “comprados”. O acordo entre o “político” e o coordenador é selado, normalmente, na presença de uma testemunha portadora de periculosidade que acompanhará a execução do contrato. Quando o investimento não apresenta retornos compatíveis, inicia-se uma ação de ressarcimentos de prejuízos que nem sempre acaba bem para o “líder comunitário” dono dos votos.
A questão nova que pode quebrar essa cadeia de corrupção eleitoral, pelo menos em Alagoas, é a desarticulação das fontes dos recursos para a compra de votos. Vários prefeitos estão sendo punidos por uso indevido de recursos públicos, inclusive tendo que devolver dinheiro aos cofres da União. A Assembléia Legislativa, aparentemente o cofre-mãe do esquema, vai perder orçamento e está muito vigiada. Some-se a isso as ações da Polícia Federal, TRE, OAB, Ministério Público e dos suplentes. Isso mesmo: as ações dos suplentes. Explico: as chapas são montadas em quase todos os partidos e coligações já se sabendo mais ou menos quem serão os eleitos. Os que sabem não ter condições de vencer, mas que esperam ficar nas primeiras suplências, estarão “acompanhando” de perto as campanhas dos cabeças de chapa, colhendo material para futuras denúncias e cassações, que resultariam nas suas ascensões ao mandato. Seria, vamos assim dizer, um caminho mais curto e mais barato para o “paraíso”. É por isso que já tem vereador fazendo os cálculos para saber se vale a pena gastar 1 milhão de reais e depois perder o mandato por causa de uma denúncia de compra de votos. Afinal é muito difícil distribuir dinheiro para 20.000 eleitores sem ser descoberto pelo recém formado Comando de Caça aos Compradores de Votos.

domingo, 6 de abril de 2008

Na Kombi com Brizola

Artigo de Vitor Hugo Soares publicado em O Globo e no Blog do Noblat

Quando a Operação Condor fechava o cerco aos líderes políticos mais resistentes às ditaduras instaladas nos principais países da América do Sul, eu trabalhava no Jornal do Brasil. Na época, estive com Leonel Brizola na sua estância no Departamento de Durazno, no Uruguai, pouco antes de ele ser expulso do país vizinho por imposição do governo Geisel, e partir para os Estados Unidos - então governado pelo democrata Jimmy Carter -, para cumprir a segunda etapa de prolongado e agitado exílio.

Ao volante da maltratada Kombi de entrega do leite produzido na fazenda, que tanta polêmica e informações desencontradas causavam na época - não raramente falsas -, o ex-governador cobrava notícias do Brasil ao visitante. Próximo ao povoado de Carmen, Brizola fez um comentário que merece reflexão nesta semana em que se completam 44 anos do golpe que derrubou o presidente João Goulart – e mais de 30 da conversa: "Anote baiano: em menos de 20 anos Portugal estará livre dos reflexos mais danosos do recém-extinto regime salazarista. No Brasil, os danos da ditadura levarão mais de 50 anos para passar".

A previsão do indomável gaúcho de Carazinho tem sido recorrente para o autor destas linhas ao longo das últimas três décadas. A lembrança, no entanto, se acentuou nestes últimos dez dias de março e abril de 2008, depois de algumas leituras e observações sobre fatos e personagens dos idos de 64, em geral confirmadores das palavras do falecido Brizola.

As mais agradáveis, sem dúvida, saltaram das páginas do livro "Confissões de um Capitão", de Carlito Lima, cujo exemplar me veio de Maceió pelo Correio, com delicada dedicatória do autor, uma dessas figuras fora de série, que só recentemente descobri de passagem por Alagoas. Militar da melhor reserva do Exército, quando serviu na Companhia de Guardas do Recife, ele foi carcereiro de figuras legendárias do País, como Miguel Arraes, Francisco Julião, Paulo Freire e Gregório Bezerra, entre dezenas de outros que curtiram celas de cadeia na chegada dos militares ao poder.

Boêmio de respeito e fama no Nordeste, Norte e Sudeste, engenheiro, escritor, o capitão foi prefeito de Barra de São Miguel – município a alguns quilômetros de distância da cidade de Palmeira dos Índios, que o alagoano Graciliano Ramos governou e imortalizou em sua obra literária de mestre.

Carlito Lima, bom de copo, de papo e de pena, não é, evidentemente, um novo Graça mas surpreende com a sua narrativa singular e sincera sobre um dos períodos mais drásticos e contraditórios da historia recente do País. Tem razão o cineasta Cacá Diegues ao considerar que "Confissões de um Capitão" é relato forte, humano, às vezes bem-humorado, outras vezes pungentes e trágicos, "mas sem aquele rancor ou aquela demagogia que, em geral, impregna e compromete muita obra sobre essa época e esse assunto".

De fato: as memórias do oficial alagoano é leitura que agarra o leitor pela emoção. Principalmente nos capítulos sobre estreita - e não raramente providencial - relação do autor com os presos políticos de Pernambuco em uma das fases mais agudas do golpe para instalação do governo discricionário. Tocantes e significativos episódios transcorridos em instalações militares, salões, ruas, praias e botequins da capital alagoana, Salvador, Manaus e Rio de Janeiro, comprovam que a delicadeza, a solidariedade e as lições de respeito à dignidade humana, não se perderam de todo no meio da selvageria ou do oportunismo engendrados em círculos de poder, na confusão da chegada do novo tempo, apoiado no arbítrio e na força bruta.

No outro lado da ponte, a linha do tempo dos chamados anos loucos, ainda espera desvendamentos essenciais, com respostas transparentes e respeitáveis como as que estão presentes no livro de memórias do capitão Carlito Lima – recentemente lançado também, junto com outras obras do ex-carcereiro de Arraes, na Feira Internacional do Livro de Havana.

É isso que se vislumbra em notícias destes últimos dias, a exemplo da nitroglicerina espalhada pela entrevista exclusiva ao Jornal do Brasil (trechos relevantes foram - reproduzidos no Blog do Noblat), de outro oficial da reserva do Exército - tenente José Vargas Jimenez - sobre episódios nos quais ele afirma ter tido participação direta ou testemunhal, durante as operações de combate à guerrilha nos recônditos da selva amazônica.

Jimenez mexe em feridas ainda abertas, com reflexos em áreas mais duras e sensíveis dos quartéis e da política de Brasília. Mexe principalmente com sentimento de dor e de esperança de dezenas de famílias em vários estados do País, cujos entes queridos se perderam na tragédia de Xambioá. Especialista em guerra na selva, posteriormente homem de inteligência do Exército, até 1994, Jimenez fez revelações estarrecedoras ao JB. "Nós entramos para matar, destruir, A ordem era atirar primeiro e perguntar depois", diz o militar em um dos trechos da entrevista.

O tenente fala de locais onde talvez possam ser encontrados ainda restos mortais de militantes do PC do B, e admite que os militares entraram na área com o propósito pré-fixado de exterminar os guerrilheiros. Diz também, sem meias palavras, que a tortura a prisioneiros e moradores da região suspeitos de abrigar ou auxiliar militantes, era prática comum para obter confissões.

No Araguaia perdi alguns dos melhores amigos, colegas de turma e contemporâneos do tempo de estudante na Universidade Federal da Bahia (UFBA): Rosalindo, Dermeval, Dina, Antonio Monteiro, Dinaelza e Wandick, dentre outros. A Bahia perdeu alguns de seus jovens mais generosos. Conforta, ao menos, ter lido esta semana, que a Comissão de Direitos Humanos da Câmara aprovou, por unanimidade, requerimento de audiência pública sobre a Guerrilha do Araguaia.

Mais que isso, é fundamental, urgente até - em especial para os familiares dos mortos e desaparecidos -, oferecer esclarecimentos cabais sobre estes e outros episódios nebulosos. Sob pena das sombras e escombros de 64 seguirem pairando sobre o País. Por mais tempo ainda que o meio século previsto por Leonel Brizola dentro da Kombi de entrega de leite no exílio.

Vitor Hugo Soares é jornalista. E-mail: vitors.h@ig.com.br

terça-feira, 1 de abril de 2008

A hora de votar em projetos

Os fatos policiais recentes, envolvendo várias autoridades públicas em Alagoas, têm levado muita gente a repensar o ato de votar. Alguns eleitores justificavam os seus votos “no amigo Taturana” com o argumento de que “políticos são todos iguais e esse, pelo menos, é meu amigo”, ou ainda ceticamente concluíam: “sempre vai existir isso aí; Alagoas não tem jeito”. Há sinais de que essa postura está mudando. Percebe-se que cada um dos votos registrados nas urnas é decisivo para impedir que amanhã um “taturana” qualquer atire em nossas caras a responsabilidade por eles estarem metendo a mão no dinheiro público. É um momento de reflexões sobre o processo de delegação de poderes e os destinos do nosso estado.

Até há pouco tempo atrás havia, em Alagoas, o poder econômico dos usineiros -- associados aos atrasados currais do sertão --, que estabeleciam um projeto político viabilizador dos seus interesses, normalmente também coincidentes com os interesses do poder central de Brasília. Alterações econômicas sociais e políticas determinaram o enfraquecimento destes segmentos. A política alagoana passou a ter como motor da formação dos seus diversos campos somente os objetivos eleitorais. Há uma fragmentação de pólos de poder que somente se unem para a viabilização dos quocientes eleitorais das chapas de deputados, normalmente já acertadas a partilha da Mesa da Assembléia. As disputas majoritárias podem se associar a esses “chapões”, desde que entrem como “sócios contribuintes”. Esta situação, obviamente, reduz o debate político e faz brotar nulidades detentoras de forte “cari$ma eleitoral”.

Em Alagoas ser honesto na política passou a ser mérito. Punir de acordo com a lei mitifica um desembargador corajoso. Se o prefeito “é bom de obras”, está tudo bem porque é melhor do que o anterior. Não podemos nos satisfazer com essa despolitização. Se temos que respeitar e reconhecer avanços, também temos que cobrar os projetos políticos de cada agrupamento. Quem está propondo caminhos para o desenvolvimento de Alagoas tendo a justiça social como perspectiva? Quem está pensando em enfrentar a violência nas suas raízes sociais e econômicas?

Alagoas pode e deve a ter eleições definidas a partir de propostas políticas. O debate tem que lembrar ao eleitor que um governo pode ser honesto e encher cidades de obras sem, entretanto, respeitar os direitos elementares da cidadania e nem apresentar perspetivas de desenvolvimento econômico e social. O processo “político-policial” em andamento nos cobra que devemos ficar atentos para a possibilidade de que o próximo pleito seja reduzido a um embate simplificado entre honestos e desonestos, ou entre arrojados construtores e pretensos construtores.

No campo da esquerda, o PT mostra amadurecimento e pode cumprir um papel importante nesse processo. Os seus parlamentares cumprem mandatos destacados. É reconhecido como o partido dos deputados Paulão e Judson que, ao lado do deputado Rui Palmeira, formam um bloco de resistência na Assembléia Legislativa Estadual. O vereador Thomaz Beltrão também é identificado por sua atuação referencial na Câmara Municipal de Maceió. Os diretórios municipais do interior se fortalecem ao serem associados ao sucesso do governo LULA. A sua militância no movimento estudantil, sindical e demais setoriais, cresce e se mobiliza principalmente a partir da unidade política que suas tendências têm conseguido estabelecer. Há uma renovação das suas direções sem que as disputas internas deixem seqüelas entre os diversos grupos. Essa maturidade política determinou a definição unânime da candidatura do deputado Judson Cabral com uma antecedência nunca encontrada. É um PT renovado que se propõe a conversar com outros partidos na perspectiva da construção de um projeto político avançado e transformador sem deixar de ser amplo. O PT vai, assim, se habilitando a disputar o poder em nosso estado. É por isso que estou convencido de que o deputado Judson Cabral é o melhor candidato a prefeito de Maceió. Isso será comprovado se estiver garantido o debate político, o que só depende do eleitor.