quarta-feira, 29 de julho de 2009

Em direção ao grunhido



Provocado que fui pelo amigo Borjão, me cadastrei no tal do Twitter. Há muito tempo já vinha recebendo convites, mas relutava em acrescentar mais algum canal digital no que considero uma já ampla inserção nesse mundo, afinal já uso email, orkut e blog. Confesso que até agora ainda não consegui entender direito o porquê de tanta badalação em torno do Twitter. Não é um blog e nem sala de bate-papo. Li textos de pessoas que o usam como um diário: achei esquisito alguém escrever que está indo ao barbeiro. Vou terminar por me associar ao José Saramago quando afirma que “os tais 140 caracteres reflectem algo que já conhecíamos: a tendência para o monossílabo como forma de comunicação. De degrau em degrau, vamos descendo até o grunhido”.
Acredito que ainda haverá um processo de “acomodação” dessa nova ferramenta e aí sim, vamos poder avaliar melhor o Twitter. Por enquanto vou ficar acompanhando de perto.

sábado, 25 de julho de 2009

O Congresso da UNE: cobertura inescrupulosa


Augusto Chagas (novo presidente da UNE)

O tratamento dispensado por parte da chamada grande mídia às organizações do movimento social no Brasil sempre foi o da desqualificação, criminalização e combate aberto. Com a UNE a situação não é diferente, mas houve, no último período, uma elevação no tom maldoso e até inescrupuloso com o qual esses veículos têm tratado a entidade que representa os estudantes universitários brasileiros.
A UNE acaba de sair do seu 51º Congresso, um dos mais importantes e o mais representativo da sua história. Mais de 2.300 instituições de ensino superior elegeram representantes a este fórum, contabilizando as impressionantes marcas de 92% das instituições envolvidas, mais de 2 milhões de votos nas eleições de base e de 4 milhões e meio de universitários representados.
Nosso Congresso mobilizou estudantes de todo o país, que por cinco dias debateram o futuro do Brasil – a Popularização da Universidade, Reforma Política, Democratização da Mídia, Defesa do Pré-Sal, etc. Se a imprensa brasileira trabalhasse a favor da democracia, esses assuntos seriam manchete em todos os jornais, rádios e canais de televisão e a disposição da juventude em lutar por um país melhor seria divulgada.
No entanto, estes veículos nos dedicaram tratamento bem diferente nestas duas últimas semanas. Cumprindo com fidelidade o ensinamento de Goebbels – uma mentira repetida mil vezes torna-se verdade – a mídia escandalosamente busca subterfúgios para atacar a UNE, taxando-a de governista, vendida, aparelhada e desvirtuada de seus objetivos. Com isso, tenta impor a todos os seus pontos de vista, sem qualquer mediação ou abertura para apresentar o outro lado da notícia.
Uma destas grosserias tem a ver com o recebimento de patrocínios de empresas públicas por parte da entidade. A UNE nunca recebeu recurso público para aplicá-lo no que bem entendesse. Recebe sim, e isto não se configura em nenhuma irregularidade, apoio para a construção de nossos encontros. Tampouco, estas parcerias comprometeram as posições políticas da entidade. Não nos impediu, por exemplo, de desenvolver uma ampla campanha – com cartazes, debates, passeatas e pronunciamentos – exigindo a demissão de Henrique Meirelles da presidência do Banco Central, que foi indicado por este mesmo governo. Não nos furtamos de apresentar nossas críticas ao MEC por sua conivência ao setor privado da educação, como no caso do boicote que convocamos ao ENADE por dois anos consecutivos.
Mas, onde estavam os jornais, as TVs, rádios e revistas para noticiar essas manifestações? Reunimos, em julho de 2007, mais de 20 mil pessoas na Esplanada dos Ministérios para pedir mudanças na política econômica do governo Lula e nenhuma nota foi publicada ou divulgada sobre isso.
Os mesmos jornais que se horrorizam com o fato de termos recebido recursos para reunir 10 mil estudantes de todo o Brasil não parecem incomodados em receberem, eles próprios, um montante considerável de verbas publicitárias do governo federal. Em 2008, as verbas públicas destinadas para as emissoras de televisão foram de R$ 641 milhões, já os jornais receberam quase R$ 135 milhões.
Ora, por qual razão os patrocínios recebidos pela UNE corrompem nossas ideias enquanto todo este recurso em nada arranha a independência destes veículos? A UNE desafia cada um deles: declarem que de hoje em diante não aceitam um centavo em dinheiro público e faremos o mesmo! De nossa parte temos a certeza que seguiremos nossa trajetória!
Com certeza não teremos resposta. Pois não é esta a questão principal. O que os incomoda e o que eles querem ocultar é a discussão sobre o futuro do Brasil e a opinião dos estudantes.
Não querem lembrar que durante a década de 90 os estudantes brasileiros – em jornadas ao lado das Centrais Sindicais, do MST e de outros movimentos sociais - saíram às ruas para denunciar as privatizações, o ataque ao direito dos trabalhadores e a ausência de políticas sociais. Que foram essas manifestações que impediram o governo Fernando Henrique Cardoso de privatizar as universidades públicas através da cobrança de mensalidades.
Não reconhecem que após a eleição do presidente Lula, a UNE manteve e ampliou suas reivindicações. Resultado delas, conquistamos a duplicação das vagas nas universidades públicas, o PROUNI e a inédita rubrica nacional para assistência estudantil, iniciando o enfrentamento ao modelo elitista de universidade predominante no Brasil. Insinuam que a UNE abriu mão de suas bandeiras históricas, mas esquecem que não há bandeira mais importante para a tradição da UNE do que a defesa de uma universidade que esteja a serviço do Brasil e da maioria do nosso povo!
Não se conformam com a democracia, com o fato de termos um governo oriundo dos movimentos sociais e que, por esta trajetória, está aberto a ouvir as reivindicações da sociedade.
A UNE não mudou de postura, o que mudou foi o governo e o Brasil e é isso que os conservadores e a mídia que está a serviço desses setores não admitem. Insistem em dizer que a UNE nasceu para ser ‘do contra’. Rude mentira que em nada nos desviará de nossa missão!
Saibam que estamos preparados para mais editoriais, artigos, comentários e tendenciosas ‘notícias’. Contra suas pretenções de uma sociedade apática, acrítica e sem poder de contestar os rumos que querem impor ao nosso país, eles enfrentarão a iniciativa criativa e mobilizadora dos estudantes na defesa de um novo Brasil. Há de chegar o dia em que teremos uma comunicação mais justa e equilibrada. A UNE e sua nova diretoria estão aqui, firmes e à disposição do verdadeiro debate de rumos para o Brasil!

* Artigo originalmente publicado no site da revista Carta Capital (http://www.cartacapital.com.br/)

domingo, 5 de julho de 2009

Papel no Varal em noite de chuva


Ricardo Cabús


Quando cheguei ao Bar Delícia das Águas, meia hora antes das oito, estava tudo pronto. Taísa e sua equipe já haviam deixado o varal de acordo com o figurino. Os cem poemas de cem autores estavam aleatoriamente pendurados nas áreas cobertas do bar. Cris Braun já tinha preparado o som como queria, com seus cabos e microfone a postos. Havia um detalhe no ajuste do som ambiente, que foi resolvido depois de alguma negociação com os botões da mesa de som. Tayra e Amanda atendiam os clientes que chegaram cedo ou nem sabiam do sarau que iria ocorrer logo em seguida. A chuva havia parado, mas o céu dizia que a noite seria molhada. A banca de livros foi montada, com obras de poetas alagoanos, graças ao Marcos de Farias Costa que forneceu parte do generoso acervo de poesia do sebo Dialética. Fernando Fiúza, Tainan Costa e Arriete Vilela também deixaram alguns exemplares.
Embora previsto para as oito, o evento começou pontualmente às nove horas. Não adianta dar murro em ponta de faca. Esse tempo serviu para boas conversas e apresentações entre pessoas que passavam a se conhecer a partir de um motivo comum. Chamei o Zé Márcio para abrir a noite, após explicar o Projeto e as regras do sarau – qualquer um pode ler qualquer poema do varal, porém um poeta não pode ler seu próprio poema e só vale o que está no varal. Para dar um norte, Zé Márcio escolheu Pontos Cardeais do Marcos de Farias Costa. Daí, seguiram-se 50 minutos de poemas interpretados por muita gente legal. Dentre outros, Jorge de Lima, Alice Ruiz, Augusto dos Anjos e Jorge Cooper se misturaram a Chico Doido do Caicó, Paulo Leminski, Mário Benedetti e TS Eliot nas mais diferentes vozes e interpretações.
Veio o intervalo e Cris Braun tomou conta do palco dando um super show, com direito a se pendurar no banco e contar histórias dos tempos de Sex Beatles, quando suas coxas foram eleitas as mais gostosas do país pela revista Heavy Metal. Voltamos para a segunda parte do sarau e convidei o Paulo Poeta para declamar Patativa do Assaré. A partir deste momento, novos atores surgiram e a noite de poesias aconteceu surpreendentemente até pouco depois da meia-noite, quando convidei Altair Roque para uma canja que varou a madrugada.
Chamou a atenção a quantidade de jovens que participaram ativamente do sarau, se juntando aos veteranos, como Dydha Lyra, Fernando Fiúza, Letícia, Malu e a própria Cris Braun que também se destacou na interpretação de poemas. Os jovens em geral começavam tímidos, tensos e se soltavam com o andar do poema. A declamação de Beijo Eterno de Castro Alves, por Rachel foi um dos pontos altos dessa leva. Amanda também interpretou com bela desenvoltura alguns poemas. Por sua vez Allan, a caminho do palco, antes de ler mais uma peça, disse a frase da noite: “Isto vicia”.
Aqui, acolá ocorreram algumas transgressões às regras do sarau por pessoas que chegaram atrasadas e não sabiam do jogo. Mas nada que comprometesse o espírito de participação coletiva onde a poesia se sobrepõe ao indivíduo. E a chuva? Sim, a chuva voltou várias vezes e em alguns momentos deu ao vento a oportunidade de jogar um banho em quem ficasse próximo às bordas do toldo, postado na entrada do bar.
E mesmo assim, com chuva no céu e final da Copa do Brasil nas tevês, o Papel no Varal compartilhou poesia com algo em torno de uma centena de seres permeáveis ao sentimento brotado de outra centena de autores que juntaram palavras que foram impressas e jogadas em um varal, quarando ao vento de em uma noite úmida e feliz.


Ricardo Cabús (r.cabus@gmail.com), coordenador do Projeto Papel no Varal, é poeta e professor universitário.